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Rio de Janeiro: A rotina de violência policial e os vídeos de celular

Segunda-feira (25) mais um vídeo de violência policial viralizou nas redes sociais. Mais uma vez a polícia militar do Rio de Janeiro encenando seu papel no espetáculo da violência diária

Um policial do 17º BPM aparece em um vídeo de celular ameaçando moradores e disparando para o alto, na localidade conhecida como Vila Joaniza, Ilha do Governador – zona norte do Rio. As imagens são de sábado passado (23), ao fim de uma operação.

Moradores alegaram no momento que um dos baleados era um trabalhador inocente, sem envolvimento com o tráfico, e portanto exigiam que o socorro fosse chamado prontamente. Diante da indiferença policial, moradores se manifestaram contra os policiais. Um dos policiais é registrado em vídeo dizendo: “Fica de graça mesmo, filho da p*. Fica de graça. Tá pensando o quê? Acabou a bagunça nessa p*. Vai tomar no c*”, depois de atirar para o alto.

O policial é flagrado subindo no estribo da viatura policial, efetuando um disparo de fuzil com apenas uma das mãos, colocando a vida de dezenas de inocentes e crianças em perigo e ainda finaliza com uma ameaça: “Você vai ser o próximo”.

Banal X Brutal?

O massacre diário a quem vêm sendo submetidos os moradores de favelas do Rio de Janeiro, no meio do fogo cruzado da dita “guerra às drogas” parece conformar um círculo vicioso que não tem fim. Em geral, a mesma fórmula: tipo suspeito, auto de resistência, mais uma morte justificada pela corporação policial e pela imprensa, mais alguns vídeos nas redes sociais. E amanhã é outro dia, e já teremos outro vídeo para compartilhar.

Os celulares vem cumprindo um papel fundamental na documentação da violência institucional que sofrem esses trabalhadores. Eles que estão presentes em todos os bolsos, também são usados como ferramenta de compartilhamento pra dentro e fora da favela. É dentro dos chats de moradores que as pessoas alertam dos riscos para quem está na rua. É com o mesmo aparelho que grupos interagem com a imprensa local e organismos de direitos humanos, para confrontar a narrativa policial, para exigir justiça. É através do celular e do 4G, muitas vezes com o pacote de dados no final, que coletivos de comunicação nas favelas denunciam esses casos nas redes sociais. É com ele que se coletam provas que posteriormente poderão ser usadas em processos judiciais.

O que um vídeo precisa para ser usado como prova?

Não significa que a violência policial foi filmada, que imediatamente o vídeo será usado como prova, infelizmente. Em alguns casos uma imagem pode ser descartada de um processo judicial se não atender algumas exigências “forenses”.

Além da pressão institucional no meio jurídico que legitima a versão do policial como prova, lhe dando mais status e credibilidade que deveriam. Não são poucos os casos em que cenas de crimes são alteradas, flagrantes forjados e toda uma infinidade de artimanhas para construir a versão do auto de resistência e livrar a pele dos policiais.

Alguns detalhes podem melhorar as condições do vídeo e fazer com que ele seja usado como prova jurídica.

1 – Arquivos Originais – quando os arquivos originais são mantidos os advogados podem verificar e atestar a autenticidade do vídeo caso o vídeo seja periciado. Também é importante fazer backups desses arquivos, preferencialmente em 2 lugares diferentes. Não ter os arquivos originais não significa imediatamente que o vídeo não possa ser uma prova, mas este elemento é um ponto relevante para considerar em se tratando de uso jurídico;

2 – Metadados – são informações complementares dos arquivos digitais, geradas automaticamente pelos equipamentos eletrônicos, que podem ser acessadas pelo autor do vídeo e mostram detalhes como hora, data e local. Elementos que podem ser fundamentais na hora de provar em juízo que um vídeo foi filmado na Vila Joaniza no dia 23 de março de 2019 como esse acima, por exemplo;

3 – Filme sem cortes – se possível filme a ação sem cortes. Um vídeo inteiro sem interferência de cortes tem a capacidade de capturar o tempo real do acontecimento e portante provar que não houve manipulação;

4 –Compartilhamento – Envie o vídeo para comunicadores e advogados de sua confiança. Considere definir com eles restrições de segurança para compartilhar os vídeos, caso haja questões de risco;

5 – Informação Complementar – Se for possível forneça informações complementares por texto, como número de viaturas, identificações policiais e um resumo explicativo sobre o que aconteceu, isso vai ajudar os advogados a proceder com o material;

Veja mais dicas de como filmar, arquivar e usar vídeos para defender direitos, na nossa seção de Tutoriais.